Há uma pergunta que sempre me fazem: qual é o número de Fiscais que a Prefeitura precisa ter para cumprir razoavelmente suas competências? Pergunta difícil de responder em vista das peculiaridades de cada local. Gostaria, por isso, colocar o assunto em discussão.
O primeiro aspecto a ser discutido seria a dimensão do trabalho dos Fiscais. Em diversas Prefeituras ainda temos a figura do “Fiscal Faz Tudo”, sem uma definição exata de suas atribuições.
Por se tratar de quadro de carreira, a lei deve especificar as funções correspondentes ao cargo, embora (incrível, mas é verdade) ainda temos muitos Municípios sem dispor de uma lei relativa aos seus cargos e respectivas funções.
Bom lembrar que a ausência de lei que defina a competência legal de seus servidores fiscais, pode tornar nulos todos os atos praticados por eles.
O exercício da fiscalização somente tem validade se houver lei que o ampare. Em todo caso, levando em conta a hipótese da existência de lei, em muitos Municípios ela não identifica os diversos grupos de fiscalização.
Centraliza tudo em um só cargo, tendo, assim, o Fiscal, incumbências genéricas, tanto de ordem tributária quanto de posturas municipais.
Além de fiscalizar tributos, também vistoria estabelecimento, fiscaliza obras particulares, vigia o uso da área pública e ainda sobra um tempo para correr atrás de camelô.
E não pensar que esse Fiscal é encontrado apenas em Municípios pequeninos; fácil encontrá-lo em alguns de porte médio, ou ainda pequenos mas com acelerado desenvolvimento. Fazer, então, um cálculo da real necessidade do Município em relação ao número de Fiscais, já se prejudica por força da dimensão do seu trabalho. Vamos, porém, supor situações em que o quadro fiscal está perfeitamente segmentado.
Temos um quadro para tratar exclusivamente de tributos, temos outro para cuidar de posturas municipais, além de outros especializados em alguns setores do exercício de poder de polícia administrativa, tais como a fiscalização de obras, de vigilância sanitária e de meio ambiente. Vamos, então, tratar da fiscalização tributária, embora o assunto deva, futuramente, ser estendido aos quadros fiscais de poder de polícia administrativa.
Preliminarmente, pergunta-se: para que serve o Fiscal Municipal de Tributos? De outra forma, a Prefeitura precisa de Fiscal para fiscalizar IPTU? ITBI? Taxas? Contribuições?
A resposta seria: necessariamente, não! Tributos lançados de ofício não precisam, em termos gerais, da ação fiscal.
Quem os lança é a Administração Fazendária e quem apura inadimplências é o sistema interno de controle financeiro.
A atuação do Fiscal, em tais casos, é basicamente interna, a responder impugnações, a fazer revisões de estimativas da base de cálculo e outras mais. Mesmo assim, com algumas limitações, pois, para exemplo, a revisão da planta de valores genéricos, para efeito de IPTU e, às vezes, de ITBI não é tarefa de Fiscais Tributários.
Pode até ser, mas mediante adaptações ao seu conhecimento básico. Tal atribuição é mais adequada aos técnicos de engenharia imobiliária, especialistas em cálculos de avaliação de imóveis. Não podemos esquecer, porém, do trabalho fiscal na apuração do valor adicionado do ICMS. O crescimento do índice de participação municipal na receita do ICMS depende, e muito, da apuração dos valores adicionados informados pelas empresas comerciais e industriais, e esse trabalho deve ser conduzido pela fiscalização municipal.
Nos Estados em que o valor adicionado é informado mensalmente, como é o caso de São Paulo, por exemplo, a atuação dos Fiscais passa a ser ininterrupta. Já nos Estados em que o valor adicionado é informado uma vez ao ano, como ainda é no Rio de Janeiro, a atuação dos Fiscais se concentra num determinado período, mais ou menos de maio a junho.
Quando o valor adicionado é informado mensalmente, cada Fiscal tem a capacidade de examinar uma média de 100 declarações de empresas por mês, mas desconsiderando aquelas enquadradas no Simples Nacional.
Desta forma, dependendo do número de empresas que declaram o valor adicionado, pode se calcular o número necessário de Fiscais em tal atividade. Caso a Prefeitura possua sistema informatizado de controle das declarações do valor adicionado, o número acima aumenta para 200 declarações por Fiscal.
O Fiscal Tributário Municipal exerce funções de auditoria. O auditor atua em fatos já ocorridos, examina o passado, aquilo que já foi feito, com o objetivo de constatar a veracidade dos dados e, também, prever correções para o futuro, pois a multa tem duas finalidades: punir o feito passado (objetiva) e desmotivar o infrator a manter a transgressão em feitos futuros (subjetiva). No jargão tributário, o auditor homologa atos praticados pelo contribuinte, ou desaprovaos.
Por isso, ao que se propõe este artigo, as expressões “Fiscal” e “Auditor” são usadas como palavras sinônimas. Varia-se o título apenas para evitar muitas repetições.
A atuação do Auditor no ISS é Indispensável, imposto que atribui ao contribuinte a obrigação de recolhê-lo espontaneamente e por responsabilidade própria.
São excluídos dessa regra os contribuintes cuja tributação esteja sob arbitramento ou estimativa, quando, então, o lançamento é feito na modalidade de ofício. Em geral, calcula-se o número ideal de Auditores Fiscais em relação ao número de contribuintes de lançamento por homologação, constante no Cadastro Mobiliário. Tomando por base que cada contribuinte deva ser fiscalizado pelo menos uma vez a cada cinco anos, e um Auditor teria condições de fiscalizar em média dois contribuintes a cada mês, poderia ser calculado um número de 120 contribuintes por Auditor.
Desse jeito, se um Município tivesse 5.000 mil contribuintes cadastrados e sujeitos a homologação, dir-se-ia que o número razoável do quadro deveria atingir 42 servidores fiscais. Todavia, essa forma clássica de calcular o número de Fiscais vem caindo por terra, juntamente ao modelo tradicional da forma de fiscalizar.
A metodologia atualmente adotada não é mais aquela de fiscalização individualizada, um contribuinte de cada vez, em que o Fiscal cumpre metodicamente normas específicas numa determinada fiscalização. O trabalho agora é global, atingindo o universo de contribuintes de uma só vez. A forma atual de fiscalizar depende basicamente da informática. E de uma legislação moderna e eficaz.
O auditor, ou grupo de auditores, trabalha internamente, analisando as informações recebidas dos sujeitos passivos do ISS. São as obrigações acessórias às quais estão obrigados, através de relatórios de serviços prestados, serviços tomados, retenções na fonte, nota fiscal eletrônica, além de outras informações como, por exemplo, as fornecidas pela Receita Federal do Brasil, quando o Município tem convênio com o órgão federal.
O trabalho em tal circunstância é, portanto, global, examinando ao mesmo tempo diversos sujeitos passivos. A distribuição dessa atividade depende do critério adotado pela chefia. Pode ser por atividade, ou seja, um Fiscal examina os contribuintes de determinado setor econômico, ou por importância da atividade na arrecadação. Ao mesmo tempo, um Fiscal, ou grupo de Fiscais, fica responsável pela análise de receitas por serviços específicos, tipo empreitada de obras de construção civil.
Durante a análise global não há, ainda, procedimento fiscal individualizado, isto é, não temos ordens de fiscalização direcionadas aos sujeitos passivos. O Fiscal ainda está concentrado num trabalho de pesquisa e filtragem.
Do resultado deste trabalho, podem ocorrer notificações dando ciência aos sujeitos passivos sobre irregularidades no cumprimento de suas obrigações, ou intimados a cumpri-las. Com a ajuda de sistemas informatizados, tais notificações e intimações são emitidas em conjunto, para diversas pessoas ao mesmo tempo.
Esse trabalho de pesquisa e filtragem interna, que exige conhecimento técnico e perspicácia do Auditor, é previamente definido por ordens de serviços procedentes da chefia fiscal. Definem-se as incongruências encontradas por grau de importância: aquelas resolvidas com simples correção interna; aquelas que devem ser notificadas ao sujeito passivo; aquelas que resultam em auto de infração; e aquelas que determinam ordem de fiscalização externa ou “de campo”.
A ordem de serviço é importante para que os Fiscais sigam um mesmo procedimento, mas não se dispensa a argúcia e o “faro” do servidor em perceber algum indício de evasão de receita. Em decorrência desse trabalho, podem, então, ocorrer ações fiscais contra sujeitos passivos específicos, realizadas, geralmente, por outro Fiscal ou grupo de Fiscais. Quando o quadro da fiscalização é pequeno, o mesmo Fiscal que efetuou a pesquisa se incumbe da fiscalização externa.
O ideal, porém, seria a atuação de outro servidor. No entanto, se for o mesmo a efetuar a fiscalização externa, o trabalho se duplica, exigindo-se mais servidores. Neste caso, presume-se a presença de mais um Auditor Fiscal em relação a três de atividade interna. Isto é, a cada três Auditores internos adicionam-se mais um para serviços externos. Diante dessa forma de fiscalizar, em muito se altera o conceito de estabelecer um número razoável de Auditores Fiscais numa Prefeitura.
Um Fiscal pode cuidar de 30 sujeitos passivos por mês, se a Prefeitura não estiver devidamente dotada de sistemas modernos de levantamento, ou pode dar conta de 60 sujeitos passivos, caso a Prefeitura esteja devidamente equipada. Não esquecer, porém, que nesta forma de auditar, acresce o número de fiscalizados, pois se soma ao de contribuintes a quantidade de tomadores de serviços responsáveis pela retenção do imposto na fonte. Temos, então, um novo patamar para definir o número razoável de Fiscais: somar o número de contribuintes por homologação com o número de tomadores de serviços “importantes” (comércio e indústria de médio e grande porte).
Dividir esse número por 12 (doze meses), para, então, dividir por 30 ou por 60, dependendo da estrutura da Administração Fazendária. Além disso, acrescentar mais um terço para serviços externos. Exemplos: O Município tem 20.000 empresas, contribuintes por homologação e tomadores de serviços relevantes. Então, temos: 20.000/12 = 1.666 por mês. 1.666/30 = 55 + 18 = 73 Auditores Fiscais (Prefeitura sem estrutura informatizada); ou 1.666/60 = 28 + 9 + 37 Auditores Fiscais (Prefeitura com estrutura informatizada). Seria, então, possível estabelecer uma quantidade razoável de Fiscais, ou Auditores, mas nunca exatamente correto, pois sempre dependemos do conhecimento técnico de todos, de ausências ou deslocamento de função, da motivação do grupo e da infraestrutura oferecida pela Administração. De qualquer modo, uma forma de cálculo exemplificativa seria a seguinte:
Cenário:
I – Cadastro Mobiliário com 5.000 contribuintes do ISS por homologação;
II – 5.000 empresas relevantes tomadoras de serviço;
III – 5.000 empresas relevantes que declaram o valor adicionado do ICMS. Número de Auditores Fiscais necessário:
Hipótese A – Fiscalização tradicional de um contribuinte por vez; não fiscaliza os tomadores de serviços e não controlam o valor adicionado do ICMS: 5.000/60 = 83/2 = 42 Auditores Fiscais.
Hipótese B – Fiscalização por grupo de sujeitos passivos, fiscalizando, também, o valor adicionado mensal do ICMS (Prefeitura sem infraestrutura): 10.000/12 = 833/30 = 28 + 9 (um terço) = 37 Auditores Fiscais e mais 4 para fiscalizar o valor adicionado. Total: 41. Hipótese C – Fiscalização por grupo de sujeitos passivos, fiscalizando, também, o valor adicionado mensal do ICMS (Prefeitura dotada de infraestrutura): 10.000/12 = 833/60 = 14 + 5 (um terço) = 19 Auditores Fiscais e mais 2 para fiscalizar o valor adicionado. Total: 21. Importante salientar que na hipótese A, a fiscalização é lenta, o retorno é, portanto, mais vagaroso, e não se fiscaliza as empresas tomadoras de serviços (muitas obrigadas a reter o ISS) e nem o valor adicionado do ICMS. Estão aí alguns pontos de discussão.
Não se trata, por evidência, de números exatos e nem se pode dizer que o aumento do universo de contribuintes vai significar um aumento proporcional de Auditores Fiscais. Mas, pelo menos, os números apresentados podem nos dar uma ideia de grandeza.
Fonte: Roberto Tauil, texto publico em 2010. Memória do Grande Mestre.