O sociólogo americano Jeremy Rifkin, que se define como ativista em favor de uma transformação radical do sistema baseado no petróleo e outros combustíveis fósseis, passou décadas exigindo uma mudança da sociedade industrial para mais modelos sustentáveis.
Rifkin é consultor de governos e empresas em todo o mundo.
Ele escreveu mais de 20 livros dedicados a propor fórmulas que garantam nossa sobrevivência no planeta, em equilíbrio com o meio ambiente e também com nossa própria espécie.
The Conversation – Em sua opinião, qual o impacto da pandemia da covid-19 no caminho para a terceira revolução industrial?
Jeremy Rifkin – Não podemos dizer que isso nos pegou de surpresa. Tudo o que está acontecendo conosco decorre das mudanças climáticas, sobre as quais os pesquisadores e eu estamos alertando há muito tempo.
Tivemos outras pandemias nos últimos anos e foram emitidos avisos de que algo muito sério poderia acontecer. A atividade humana gerou essas pandemias porque alteramos o ciclo da água e o ecossistema que fazem o equilíbrio no planeta.
Desastres naturais — pandemias, incêndios, furacões, inundações… — continuarão porque a temperatura na Terra continua subindo e porque arruinamos o solo.
Há dois fatores que não podemos deixar de considerar: as mudanças climáticas causam movimentos da população humana e de outras espécies. A segunda é que as vida sanimal e a humana estão se aproximando todos os dias como consequência da emergência climática e, portanto, seus vírus viajam juntos.
The Conversation – Esta é uma boa oportunidade para aprender lições e agir, não acha?
Rifkin – Nada voltará ao normal novamente. Esta é uma chamada de alerta em todo o planeta. O que temos que fazer agora é construir as infraestruturas que nos permitam viver de uma maneira diferente.
Devemos assumir que estamos em uma nova era. Caso contrário, haverá mais pandemias e desastres naturais. Estamos diante de uma ameaça de extinção.
The Conversation – Você trabalha, estará trabalhando nesses dias, com governos e instituições ao redor do mundo. Não parece haver consenso sobre o futuro imediato.
Rifkin – A primeira coisa que devemos fazer é ter um relacionamento diferente com o planeta. Cada comunidade deve assumir a responsabilidade de como estabelecer esse relacionamento em sua esfera mais próxima.
E sim, temos que começar a revolução em direção ao Green New Deal ( proposta que estimula os Estados Unidos a alcançarem o nível zero de emissões líquidas dos gases do efeito estufa, além de outras metas) global, um modelo digital de zero emissões; temos que desenvolver novas atividades, criar novos empregos, para reduzir o risco de novos desastres.
A globalização acabou, devemos pensar em termos de glocalização. Esta é a crise de nossa civilização, mas não podemos continuar pensando na globalização como hoje, pois são necessárias soluções glocais para desenvolver infraestruturas de energia, comunicação, transporte e logística…
The Conversation – Você acha que durante esta crise, ou mesmo quando a tensão diminuir, governos e empresas tomarão medidas nessa direção?
Rifkin – Não. A Coreia do Sul está combatendo a pandemia com tecnologia. Outros países estão fazendo o mesmo. Mas não estamos mudando nosso modo de vida.
Precisamos de uma nova visão, uma visão diferente do futuro, e os líderes nos principais países não têm essa visão. São as novas gerações que podem realmente agir.
The Conversation – Você propõe uma mudança radical na maneira de ser e ser no mundo. Por onde começamos?
Rifkin – Temos que começar com a maneira como organizamos nossa economia, nossa sociedade, nossos governos; por mudar a maneira de estar neste planeta.
A nossa é a civilização dos combustíveis fósseis. Nos últimos 200 anos, foi baseada na exploração da Terra.
O solo permaneceu intacto até começarmos a cavar as fundações da terra para transformá-la em gás, petróleo e carvão. E nós pensamos que a Terra permaneceria lá sempre, intacta.
Criamos uma civilização inteira baseada no uso de fósseis. Usamos tantos recursos que agora estamos recorrendo ao capital fundiário, em vez de obter benefícios dele.
Estamos usando uma terra e meia quando só temos uma. Perdemos 60% da superfície do solo do planeta. Ele desapareceu e levará milhares de anos para recuperá-lo.
The Conversation – O que você diria para aqueles que acreditam que é melhor viver o momento, o aqui e agora, e esperam que no futuro outros venham para consertá-lo?
Rifkin – Estamos realmente diante das mudanças climáticas, mas também há tempo de mudá-las.
As mudanças climáticas causadas pelo aquecimento global e pelas emissões de CO₂ alteram o ciclo da água na Terra.
Nós somos o planeta da água, nosso ecossistema emergiu e evoluiu ao longo de milhões de anos graças à água. O ciclo dela nos permite viver e se desenvolver.
E aqui está o problema: para cada grau de temperatura que aumenta como consequência das emissões de gases de efeito estufa, a atmosfera absorve 7% a mais de precipitação do solo e esse aquecimento os força a cair mais rápido, mais concentrado e causando mais desastres naturais relacionados à água.
Por exemplo, grandes nevascas no inverno, inundações na primavera em todo o mundo, secas e incêndios durante o verão e furacões e tufões no outono varrendo nossas costas.
As consequências vão piorando com o tempo.
Estamos diante da sexta extinção e as pessoas nem sabem disso. Os cientistas dizem que metade dos habitats e animais da Terra desaparecerão em oito décadas.
Essa é a posição em que estamos. Estamos de frente com uma potencial extinção da natureza para a qual não estamos preparados.
The Conversation – Quão grave é essa emergência global? Quanto tempo resta?
Rifkin – Não sei. Faço parte desse movimento de mudança desde a década de 1970 e acho que o tempo de que precisávamos passou.
Nunca voltaremos onde estávamos, à boa temperatura, a um clima adequado…
A mudança climática estará conosco por milhares e milhares de anos; a questão é: podemos, como espécie, ser resilientes e nos adaptar a ambientes totalmente diferentes e que nossos companheiros na Terra também possam ter a oportunidade de se adaptar?
Se você me perguntar quanto tempo levará para mudarmos para uma economia limpa, nossos cientistas na cúpula europeia sobre mudança climática em 2018 disseram que ainda temos 12 anos. Já é menos que nos resta para transformar completamente a civilização e começar essa mudança.
A Segunda Revolução Industrial, que causou mudanças climáticas, está morrendo. E isso se deve ao baixo custo da energia solar, que é mais lucrativa que o carvão, o petróleo, o gás e a energia nuclear.
Estamos caminhando para uma Terceira Revolução Industrial.
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Fonte: BBC.