A Prefeitura do Rio de Janeiro anunciou que os tributos municipais devidos a partir de janeiro de 2023 poderão ser pagos com o uso de moedas digitais, as criptomoedas. A reportagem foi publicada na revista Exame.
A notícia confirma um fato que muito nos interessa enquanto estudiosos da modernização e da gestão disruptiva.
Importante observar que o direito recebe atualização na medida que a sociedade evolui. Hoje a legislação não prevê pagamento de tributos que não sejam em reais. Inclusive a própria indexação dos valores de tributos é inviável.
O Código Tributário Nacional prevê, em seu artigo 162 (Lei nº 5172/66), o pagamento de tributos por meio de moeda, cheque, vale postal, estampilhas, papel selado e processo mecânico. Obviamente que uma legislação da década de 60 não previa tal possibilidade de pagamento. Cabe à sociedade, o que está fazendo a prefeitura carioca, promover mudanças que amanhã impactarão na legislação.
O modelo que estão estabelecendo em terras fluminenses é da contratação de empresa do setor de moedas digitais, que auxiliaria a prefeitura na conversão imediata das criptomoedas em reais, ingressando nos cofres públicos os valores nos moldes do que prevê o CTN. Assim, o contribuinte paga em criptomoedas e a consultoria contratada transforma os valores em reais.
A legislação municipal deverá regular a transação e a consequente contratação desse prestador de serviços que atuará na conversão dos valores.
O mundo já vem utilizando o bitcoin em grandes transações, afastando o temor de muitos em atuar com moeda que seria uma espécie de dinheiro “alternativo”. A Tesla e outras empresas já aceitam pagamento utilizando-se o bitcoin.
Em Israel há bancos utilizando criptomoedas e o próprio Banco Central do país está estudando a utilização desse dinheiro novo. El Salvador, que é precursor na movimentação de Bitcoin, anunciou uma cidade da criptomoeda.
Há alguns aspectos jurídicos a serem considerados quando se fala em pagamento de tributos usando as criptomoedas. E o gestor carioca está considerando-os.
A grande vantagem seria a possibilidade do ente recuperar ativos seus (dívidas tributárias), utilizando recursos que o contribuinte detém em suas contas.
No modelo adotado pelo Rio de Janeiro, que não é tão agressivo, os valores seriam convertidos imediatamente, por empresa especializada. A Fazenda pública nos absorveria criptomoedas.
Atitude mais disruptiva seria o tesouro municipal incorporar ao seu patrimônio as próprias criptomoedas. O anúncio atual não prevê isso no momento, mas autoridades da capital fluminense já falaram na possibilidade da administração adquirir criptomoedas e detê-las como reserva em seus cofres, incorporando-as ao seu patrimônio.
Verdade é que muito se desconhece sobre o tema criptomoedas. E o temor dos investidores é fruto do desconhecimento. No Brasil não se conhece legislação regulando tais ativos financeiros, nem transações utilizando-as. Mas muito em breve o legislador deverá debruçar-se sobre essa nova realidade econômica do mundo.
A prefeitura, segundo informe em seu próprio site, quer transformar a cidade num centro tecnológico, atraindo investimentos e incentivo cultural, usando as criptomoedas. Ou seja, vai usar a inovação para fortalecer a economia local. No mesmo anúncio a prefeitura ainda falou em regulamentar o pagamento de serviços de táxis utilizando-se as moedas digitais. A princípio já atraiu a nossa atenção e a cidade está sendo observada como gestão disruptiva.
A adoção da moeda digital é uma inovação que certamente vai provocar a atenção de outras cidades brasileiras, fortalecendo o movimento em prol dessa verdadeira inovação tecnológica. Em poucos anos isso nem será mais notícia.
José Souto Tostes é ex-procurador municipal, ministrante de cursos na área de licitações e direito público, articulista e autor do blog “Artigos”, onde publica textos comentando a legislação brasileira e decisões da Justiça. Atualmente é advogado na área de licitações, representando empresas que atuam no mercado de fornecimento ao Poder Público, além de prestar consultoria para municípios e Câmaras Municipais.